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O Poder, a Justiça e a Gravidade do Crime

  • Foto do escritor: Rogério Mazzetto Franco
    Rogério Mazzetto Franco
  • 3 de set.
  • 2 min de leitura

A força de uma instituição não se mede apenas por seus códigos, mas pela confiança que a sociedade deposita nela. O Judiciário, em especial, existe na medida em que é visto como instância última de imparcialidade. Quando essa percepção se abala, o que se fragiliza não é apenas a imagem de um tribunal, mas a própria ideia de justiça como fundamento da vida em comum.


É nesse ponto que a relação entre o crime organizado e familiares de ministros das cortes superiores adquire significado político maior do que aparenta. Não se trata apenas de contratos ou honorários advocatícios. Trata-se de símbolos. E os símbolos, em política, muitas vezes são mais decisivos do que os fatos em si.


O caso do filho do ministro da Justiça Ricardo Lewandowski, advogado de uma empresa investigada por esquemas bilionários ligados ao PCC, e o da filha do ministro do Superior Tribunal de Justiça João Otávio de Noronha, cujo escritório recebeu vultosa quantia de outra empresa sob investigação da Polícia Federal, expõem um traço essencial da crise institucional brasileira: a confusão entre o que é legal e o que é legítimo. Não basta que não haja crime. É preciso que não haja sombra.


A filosofia política ensina que a lei não é apenas norma coercitiva, mas pacto moral. Montesquieu advertia que a corrupção começa quando os cidadãos perdem a confiança no espírito das leis; e Tocqueville lembrava que a força das democracias está menos em suas regras do que nos costumes que lhes dão sustentação. Nesse sentido, a proximidade entre investigados e familiares de magistrados corrói não apenas a liturgia da Justiça, mas a crença de que todos são iguais perante ela.


O que o Brasil testemunha é a substituição da moral pública pela lógica privada do “não há ilegalidade”. O efeito é devastador. Se a lei se reduz a uma letra fria, desprovida de espírito ético, abre-se espaço para que o crime organizado se mova com naturalidade dentro do sistema que deveria contê-lo. Não é preciso corromper juízes: basta atrair para sua órbita aqueles que carregam seus sobrenomes.


Há, portanto, uma lição mais profunda: a Justiça não pode ser apenas formal. Precisa ser também visível como justa. Sem essa visibilidade, perde sua autoridade moral e se converte em mera técnica jurídica, incapaz de sustentar a ordem política.

A proximidade entre investigados e familiares de ministros pode até não configurar crime. Mas configura, de maneira inescapável, a erosão da confiança. E, quando essa confiança se dissolve, resta apenas o cinismo. O crime organizado, que sempre soube explorar as brechas da lei, descobre então a brecha mais preciosa: a indiferença de uma sociedade anestesiada diante do colapso silencioso da moralidade pública.


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