Abercrombie & Fitch, American Eagle e o novo dogma publicitário: o que a cultura do cancelamento realmente quer?
- Rogério Mazzetto Franco
- 1 de ago.
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Fundada em 1892 por David T. Abercrombie, a Abercrombie & Fitch iniciou sua trajetória como uma loja de artigos de alta qualidade para atividades ao ar livre. Décadas depois, a marca se reinventou e tornou-se símbolo de uma juventude aspiracional, atlética e bela, especialmente nos anos 1990 e 2000. O sucesso foi estrondoso, mas veio acompanhado de críticas — não ao produto, mas à imagem.
A empresa foi acusada de promover um padrão estético excludente: jovens brancos, magros e atléticos eram tanto os rostos das campanhas quanto os funcionários das vitrines. Em 2003, um processo coletivo por discriminação racial expôs práticas internas da companhia que, segundo os acusadores, marginalizavam minorias raciais. O caso ganhou repercussão global, resultou em um acordo multimilionário e levou a empresa a revisar suas políticas de contratação e marketing.
Esse movimento não foi apenas jurídico, mas também cultural. A Abercrombie tornou-se alvo de campanhas organizadas por ativistas e parte da imprensa, que exigiam uma reconstrução total da marca sob o manto da diversidade. Diante da pressão, a empresa cedeu: diversificou seus modelos, alterou o layout das lojas, reconfigurou seu estilo e afastou executivos ligados à fase anterior. Para alguns, um progresso necessário. Para outros, uma descaracterização.
Agora, mais de duas décadas depois, uma situação semelhante atinge outra marca do mesmo segmento: a American Eagle. Recentemente, a empresa lançou uma campanha publicitária estrelada pela atriz Sydney Sweeney, conhecida por seus papéis de destaque em Hollywood e por representar uma feminilidade clássica — loira, sensual, branca e elegante. Apesar de seu apelo popular e carisma evidente, a campanha foi alvo de críticas ferozes por setores da mídia progressista e usuários de redes sociais, que acusaram a marca de promover um “padrão ultrapassado” e de não representar “corpos reais” ou “mulheres diversas”.
A reação beirou o absurdo: criticar uma atriz por ser bonita demais. Exigir de uma marca que ela não associe seus produtos a um ideal estético legítimo — e perfeitamente válido dentro da pluralidade do mercado — revela muito sobre o espírito do tempo. Em vez de celebração da diversidade, o que se vê é uma tentativa de uniformização ideológica, onde qualquer representação que fuja do modelo imposto por militâncias organizadas se torna “problemática”.
Assim como a Abercrombie & Fitch foi forçada a abandonar sua identidade para sobreviver ao boicote moral travestido de justiça social, a American Eagle agora se vê pressionada a justificar a escolha de uma atriz que, até onde se sabe, apenas incorporou o papel que lhe foi proposto: representar um produto de moda com autenticidade e carisma.
O que está em jogo não é apenas uma questão de estética, mas de liberdade empresarial e expressão de marca. Em um mercado verdadeiramente livre, marcas têm o direito de direcionar suas campanhas para públicos específicos, inclusive aqueles que valorizam uma estética mais tradicional ou aspiracional. Isso não representa exclusão, e sim segmentação — algo básico em qualquer estratégia de mercado.
Não há escassez de marcas que promovem diversidade em todos os aspectos: cor, corpo, orientação, estilo. Por que, então, não se pode tolerar que algumas mantenham uma linguagem visual mais clássica ou aspiracional? Por que Sydney Sweeney — uma mulher que representa, para milhões, um ideal de beleza e talento — não pode ser celebrada como tal?
A resposta está na mudança do que se entende por “inclusão”: deixou de ser um convite e passou a ser uma exigência. A diversidade, que deveria significar espaço para todos, tornou-se uma doutrina que exige submissão total a um único discurso estético e político. Quem não se encaixa, mesmo que involuntariamente, é acusado, silenciado ou “cancelado”.
A Abercrombie & Fitch quase foi destruída por esse movimento. A American Eagle, agora, é alvo das mesmas forças. Mas a pergunta central permanece: a quem serve essa suposta diversidade que não tolera o diferente, que não admite exceções, que transforma beleza em culpa e estilo em crime?
A pluralidade de gostos, públicos e linguagens deve ser preservada. E isso inclui o direito de uma marca apostar em Sydney Sweeney como rosto de sua campanha, assim como inclui o direito de outra marca escalar um elenco diverso. O verdadeiro risco para o mercado — e para a cultura — é acabar com a liberdade de escolha sob o pretexto da inclusão compulsória.
Se o público ainda deseja beleza, estilo e distinção, não cabe à militância reeducar esse desejo. Cabe ao mercado ouvi-lo. E cabe à sociedade defender a liberdade de quem oferece essa resposta — ainda que ela não seja “politicamente correta”.




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